Dina Esteves Pimentel – Benguela, Angola

O Emprego pelo Mundo esteve à conversa com a Dinorah, como gosta de ser chamada, uma Portuguesa pelo Mundo a viver há 4 anos em Benguela, Angola. A Dina conta-nos as maravilhosas aventuras e desventuras deste percurso pelas terras quentes de África.

No continente Africano já visitou Moçambique, Angola, Namíbia, Zimbabué, Botsuana, África do Sul, Malawi, Suazilândia, Madagáscar e São Tomé e Príncipe. O Velho Continente foi também destino das suas pisadas, tendo passado por Espanha, França, Suécia, Dinamarca, Holanda, Suíça, Itália, Áustria e República Checa. Passou ainda pelas Maldivas, no extremo Oriente.

Trabalho num projeto de educação, pela Cooperação Portuguesa. Faço a coordenação científico-pedagógica do projeto “Saber Mais”, na província de Benguela. Trabalho com uma equipa de professores portugueses das mais variadas áreas disciplinares e este projeto tem como principal objetivo o reforço do ensino secundário em Angola. Atuamos, essencialmente, em Escolas de Formação de Professores (na formação inicial e contínua, dinamização e gestão de centros de recursos e outras atividades). O projeto está em três províncias (Benguela, Namibe e, mais recentemente, Cabinda) até ao momento.

O “Saber Mais” é um projeto desenvolvido pelo CICL – Instituto da Cooperação e da Língua (Ministério dos Negócios Estrangeiros – Portugal) e o Ministério da Educação de Angola. Posso dizer que trabalho na minha área académica, visto que tenho formação em ensino. Mas é algo mais, pois faço a gestão do projeto a nível provincial, liderança da equipa, gestão logística, etc…. Ou seja, estou em aprendizagem constante.

Paralelamente faço também fotografia. Em 2010 fiz um curso de iniciação e após uma série de workshops de retrato, moda, fotografia de estúdio, etc., e mantenho-a como hobby.

Este é o 4º ano que estou em Angola. Cheguei em Janeiro de 2010, mas antes tinha vivido pouco menos de 1 ano em Moçambique. A oportunidade não surgiu, foi encontrada! Ou, explicando ainda melhor, procurada! Conjuntamente com o meu marido e por decisão pessoal na altura, chegamos à conclusão que gostaríamos de viver em África. Foram colocadas várias opções, na altura (em 2008), e a oportunidade acabou por surgir em Moçambique. Lecionei na Universidade Pedagógica, na cidade de Quelimane, província da Zambézia (a cerca de 1700km da capital, Maputo). Após a experiência de ensino em Moçambique e de regresso a Portugal, tive conhecimento do projeto da Cooperação Portuguesa “Saber Mais”, por meio de antigas colegas de licenciatura.

Concorri para a coordenação científico-pedagógica na província de Benguela e a experiência adquirida em Moçambique foi determinante para a minha integração na mesma. Vim cá ter por contrato estabelecido diretamente com o (ex)IPAD – Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento, agora CICL – Camões, Instituto da Cooperação e da Língua. Qualquer pessoa que esteja interessado em trabalhar em projetos de cooperação, pode começar por inscrever-se na Bolsa de Agentes de Cooperação, através do site do CICL.

Fechar a porta de casa e partir! (risos) Não posso dizer que tenha tomado grandes precauções. Como tinha vivido em Moçambique, já tinha passado pelo processo de vacinação obrigatório (febre amarela) e feito a consulta do viajante até mais do que uma vez. Foram escolhidas roupas frescas e alguns objetos de carácter pessoal e parti.

Todas as mudanças pressupõem uma decisão e um momento difícil. Eu tive o caminho facilitado quando, aos 13 anos, os meus pais decidiram ir viver e trabalhar dos Açores para Aveiro. Na altura e com a idade que tinha custou-me muito. Foi a primeira grande mudança, mas também a primeira grande aventura. Hoje sou-lhes muito agradecida pela sua decisão e no quanto isso mudou a minha vida e a dos meus irmãos.

É claro que um afastamento da família e amigos é sempre um pouco triste, mas a excitação e a vontade de uma nova aventura foi maior. Não considero que tenha sido difícil, antes pelo contrário, estava muito feliz pela conquista e ansiosa com o que ainda havia de aprender.

A primeira semana… Ah! Foi em Janeiro, portanto muito calor, muita humidade (algumas baratas também!) e o conhecer das ruas de Benguela. Quando saía para ir trabalhar tomava sempre o mesmo caminho, para evitar perder-me, mas no regresso vinha mais tranquila e também mais distraída. Foram raros os dias em que não me perdi pela cidade! Foi também uma boa maneira de ir conhecendo Benguela.

Angola em 3 palavras?

COOPERAÇÃO, ACÁCIAS-RUBRAS, SORRISOS-DE-CRIANÇA!

Falar de choques culturais pressupõe diferenças entre as pessoas e a cultura de cada. Sou portuguesa e nunca deixarei de o ser, logo com todas as características culturais marcadas em mim, desde criança. É natural que existam algumas diferenças culturais quando mudamos de cidade, de país, de continente. Talvez a maior diferença esteja relacionada com o facto de ser mulher, ter 35 anos e não ter filhos. Não é comum aqui em Angola e noutros países de África também não. Por vezes perguntam-me com admiração como é possível, que não acreditam! Normalmente sorrio e explico que fui educada de modo diferente – sim, porque dizer que “ainda sou nova” não é uma boa explicação! (risos!)

 

Ah! Vivi imensas aventuras aqui e nestes países de África subsaariana que tenho tido a oportunidade (e sorte) de viver e visitar! Há dias em que tudo acontece. Quero partilhar uma das primeiras aventuras que tive em África, portanto, em Moçambique, em final de 2008 ainda… Chegada a Quelimane (cidade da província da Zambézia) fui, com outras pessoas, dar um passeio de carro para ver uma plantação de coqueiros que ficava a uns 150-200km da cidade. A dada altura da viagem o jipe onde seguíamos avariou e tivemos que encostar o carro. Olhei em volta e para além da longa estrada reta que parecia não acabar, nada havia por ali.

Olhei melhor e vi umas crianças que brincavam em cima de uma termiteira (enorme, maior do que as casas) e apenas uma ou outra casa (muito simples, de telhado de colmo). Encostámos o carro à sombra de uma árvore enquanto esperávamos que alguém viesse socorrer. Do nada aparecerem uns homens que carregavam 3 cadeiras. Três cadeiras de madeira, muito, muito simples, meias toscas até. Chegaram ao pé de nós (éramos 3 pessoas) e colocaram as cadeiras ao lado do carro, na sombra, e sem abrir a boca retiraram-se. Eu fiquei a olhar e perguntei a quem ia connosco o que era aquilo: “É para nos sentarmos. Viram que estamos em apuros. Estão a ajudar. E se demorarmos muito mais tempo, trazem comida também. Não temos que ficar aflitos”.

Não consigo (ainda hoje) explicar o que senti nesse momento. Foi a primeira de muitas lições. Chegou o socorro umas horas depois e partimos. Nunca mais os vi, nem nunca chegamos a agradecer. “Não é preciso” – dizia quem era de lá: “Hoje nós, amanhã eles”.

Acredito que parte do meu futuro passe por aqui, sim (como já está a ser), no entanto, também penso na vastidão e imensidão do mundo. Sou uma curiosa nata e sedenta de aprendizagem. Descobri com as minhas viagens imensos mundos novos e em cada um deles, uma riqueza inigualável. Tudo isso se reflete em quem sou, no meu dia-a-dia, no meu trabalho, na fotografia, com quem me relaciono e em mim como pessoa.

Aos jovens portugueses apenas quero deixar uma ideia: a carga negativa associada à palavra “emigração” deveria ficar fechada numa gaveta. Talvez esteja na hora de dar novo(s) sentido(s) à mesma: aventura, aprendizagem, clarividência… Não quero com isto dizer que o fato de não se conseguir arranjar um emprego no nosso país deva ser visto como uma “oportunidade”. Não. Acredito que Portugal deveria ser o primeiro a dar oportunidade de trabalho e vida aos nossos jovens, que são a riqueza primária de um país. Ainda assim, aconselho a todos a viajar. Porque abre horizontes, mentes e enriquece. E nada melhor do que voltar para casa mais rico de sabedoria, de amizades, de companheiros… de humanidade.